Brasília, 61 anos: Praça do Cruzeiro testemunhou 31 fatos históricos e nasceu antes mesmo da capital
Confira fotos de eventos que marcaram construção da nova capital. Imagens do Arquivo Público compõem exposição virtual; G1 faz série de reportagens pelo aniversário da cidade.
Em 1956, antes mesmo da inauguração de Brasília, o lugar mais alto do quadrilátero demarcado como Distrito Federal se tornou a Praça do Cruzeiro, a 1.172 metros de altitude. O espaço, hoje, no Eixo Monumental, foi um dos locais mais visitados no período da construção e ponto de encontro de pioneiros, engenheiros e do então presidente da República, Juscelino Kubitschek. De lá se podia vislumbrar a vastidão do canteiro de obras.
Antes mesmo do projeto de Lucio Costa, o local nasceu tão importante quanto a própria cidade que se construía aos seus pés, por causa do cruzeiro ali instalado. Segundo levantamento de pesquisadores do Arquivo Público do Distrito Federal, a praça foi palco de pelo menos 31 eventos marcantes da nova capital (veja lista abaixo).
As fotografias, documentos e informações são resultado de um trabalho de um ano de pesquisa feita por servidores do órgão, reunidos em uma exposição em homenagem ao aniversário de 61 anos de Brasília. A reportagem do G1 faz parte de uma série especial que já abordou os seguintes temas:
Pessoas esperam pelo eclipse solar na Praça do Cruzeiro, em Brasília
Os primórdios...
Confira eventos que marcaram a história de Brasília e da Praça do Cruzeiro:
- Fevereiro de 1955 - A visita
A história da Praça do Cruzeiro começa em fevereiro de 1955, quando o Marechal José Pessoa – presidente da Comissão de Localização da Capital Federal – e sua comitiva visitaram cinco lugares no Planalto Central para a escolha definitiva do lugar onde a capital seria construída.
Em um dos espaços, batizado de "Sítio Castanho", a equipe se dirigiu ao ponto mais elevado da região. Pela primeira vez, o local, que ainda não tinha sido batizado como Praça do Cruzeiro, serviu para vislumbrar a cidade que iria nascer.
- Abril de 1955 - O deslumbre
Praça do Cruzeiro, abril de 1955 — Foto: Arquivo Público-DF/Divulgação
Na primeira visita àquela colina plana, ponto mais alto da Fazenda Bananal, que alguns meses depois receberia uma pequena cruz da madeira, seis jipes estacionaram. Ernesto Silva, um dos membros da comitiva descreveu a vista:
"Tudo em redor era azul, horizonte infinito! Permanecemos por alguns minutos, extasiados, a nos sentirmos pequeninos ante [...] a antevisão da cidade moderna a ali se erguer, dentro em breve [...]."
- Maio de 1955 - Praça do Cruzeiro recebe cruz de pau-brasil
Praça do Cruzeiro, em maio de 1955: recebe o seu batismo, uma cruz de pau-brasil — Foto: Arquivo Público-DF/Divulgação
No fim de abril de 1955, por meio de um acordo com a Comissão de Localização da Capital Federal, o governo de Goiás declara de "utilidade pública" as terras dentro da área do novo Distrito Federal.
Marechal José Pessoa, presidente da comissão, solicita ao governo de Goiás que coloque uma cruz no ponto mais alto do lugar escolhido para a construção de Brasília, no intuito de demarcar o lugar. O então o vice-governador de Goiás, Bernardo Sayão, se encarregou da missão:
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Dois galhos de madeira pau-brasil foram entrelaçados, e cruz de madeira foi plantada no chão do Cerrado. Estava batizado o local. A partir de abril de 1955, aquele mirante é designado nos documentos como "o Cruzeiro".
- Maio de 1955 - A praça recebe um cruzeiro permanente
Mapa mostra demarcação do Distrito Federal — Foto: Arquivo Público/Coleção Goyaz/Acervo Altamiro de Moura Pacheco
Poucas semanas após o vice-governador de Goiás cravar a primitiva cruz feita com galhos de pau-brasil, a comitiva decidiu também instalar uma cruz de madeira aroeira torneada, maior do que a primeira, com uma base feita em alvenaria recoberta com pedras. O motivo: a visita do presidente da República, Café Filho.
Ao redor da base, um tablado em madeira permitia uma visão ainda melhor da região e servia aos visitantes para as fotografias. A partir de abril de 1975, a Praça do Cruzeiro recebeu uma réplica do primeiro Cruzeiro. A cruz original está em exposição permanente na Catedral Nossa Senhora Aparecida, em Brasília.
- 1954 a 1955: Praça do Cruzeiro recebe o Marco Geodésico nº 8 do IBGE
Praça do Cruzeiro recebe o Marco Geodésico nº 8 do IBGE — Foto: Arquivo Público-DF/Divulgação
Para situar no chão do Cerrado o projeto da nova cidade capital, no chão da Fazenda Bananal, era necessário ter uma referência geodésica de latitude e longitude amarrada às coordenadas do Sistema Geodésico Brasileiro.
Foi, portanto, na Praça do Cruzeiro que foi instalado o marco geodésico identificado por uma pequena bandeira à direita do monumento. Com base nele, os topógrafos da Novacap colocaram o plano de Lucio Costa no chão.
Atualmente o Vértice nº 8 pode ser visto ao lado da Praça do Cruzeiro em concreto e pintado com tinta laranja.
- Outubro de 1956 - Praça recebe a primeira visita do Presidente da República, Juscelino Kubitschek
Outubro de 1956: praça recebe a primeira visita do Presidente da República, Juscelino Kubitschek — Foto: Arquivo Público-DF/Divulgação
Em 2 de outubro de 1956, o presidente Juscelino Kubitschek visitou pela primeira vez o local. Depois do avião aterrissar em uma pista de pouso provisória onde depois foi construída a Rodoferroviária, JK seguiu para a Praça do Cruzeiro.
"Quando o avião sobrevoou o local da futura capital, concentrei-me em observar a região. [...] Tudo era chato e plano – a vastidão desconcertante do vazio", relatou o presidente.
"Lá estava o Cruzeiro, de braços abertos, como que saudando os intrusos que chegavam pelo céu. [...] Visitei o local onde se erguia o Cruzeiro, o qual, sendo o ponto mais elevado da região, permitia uma visão de conjunto do cenário que emolduraria a futura capital. A vista era maravilhosa."
- Outubro de 1956 - Local das primeiras decisões sobre as obras de Brasília
Praça do Cruzeiro – outubro de 1956: local das primeiras decisões sobre as obras de Brasília — Foto: Arquivo Público-DF/Divulgação
A urgência para início das obras levou JK a tomar algumas decisões durante a primeira visita, em 2 de outubro de 1956. Ao redor do enorme Cruzeiro, o presidente, Oscar Niemeyer, Israel Pinheiro (recém-nomeado presidente da Novacap) e outros membros da comitiva começaram a examinar os mapas preparados para a ocasião.
Como a prioridade era a construção de um terminal aéreo, na praça, segundo relatos históricos que constam no Arquivo Público, ficou decidido o início imediato da construção do Aeroporto Internacional de Brasília.
Novembro de 1956 - Local do primeiro Culto Evangélico na capital
No dia 30 de novembro de 1956, um grupo de pastores da Igreja Batista se dirigiu até o Cruzeiro e celebrou a primeiro culto evangélico na nova capital. "Rezaram em conjunto pedindo as bençãos para a cidade que nascia", citam documentos das época.
- Abril de 1957 - A praça presenciou o espanto do urbanista Lucio Costa
Urbanista Lucio Costa ao lado do presidente JK — Foto: Arquivo Público-DF/Divulgação
Era 2 de abril de 1957, Lucio Costa fez a primeira e única visita ao lugar onde Brasília seria construída, ao lado de JK e do Cruzeiro.
- Abril de 1957 - A Praça do Cruzeiro assiste ao dia do nascimento de Brasília
Em 16 de março, um concurso nacional havia escolhido o projeto urbano de Lucio Costa para a construção da cidade capital. As coordenadas foram calculadas no Rio de Janeiro por Augusto Guimarães Filho, escolhido para levar o projeto adiante. O dia seria histórico!
O Vértice nº 8 do IBGE já estava lá na Praça do Cruzeiro a indicar as referências topográficas. Cientes da importância do momento, o Cruzeiro foi escolhido como testemunha oficial do evento. Toda a equipe se colocou ao redor da enorme cruz para a foto histórica.
Quem fincou a Estaca Zero no chão foi o engenheiro e agrimensor Ronaldo de Alcântara Velloso. A partir daquela colina, a praça que tudo testemunhava, nascia Brasília.
- Maio de 1957 - A primeira missa em Brasília
Maio de 1957: a primeira missa em Brasília — Foto: Arquivo Público/Coleção Documentos Goyaz
No dia 3 de maio de 1957, o Cruzeiro recebeu mais de 15 mil pessoas para a celebração da primeira missa em Brasília.
Para presidir a celebração, na ocasião ainda celebrada em latim, o presidente Juscelino Kubitschek convidou Dom Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta, Arcebispo de São Paulo.
Na ocasião, segundo documentos históricos, a liturgia associou a primeira missa em Brasília à primeira missa rezada em 3 de maio de 1500, após a chegada dos portugueses na América.
"A 3 de maio, Brasília torna-se autenticamente brasileira, porque, desde as origens, o Brasil existe com a presença de Cristo. Com a Primeira Missa planta-se em Brasília uma semente espiritual", diz trecho do Diário de Brasília, obra do Serviço de Documentação da Presidência da República.
Maio de 1957 - Acolhe a primeira imagem de Nossa Senhora Aparecida
A primeira missa em Brasília foi celebrada sob um toldo de lona, sobre chão de assoalho, onde foi montado o altar que recebeu a imagem de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil. Atrás da imagem foi estendida a bandeira do Brasil.
- Maio de 1957 - O primeiro discurso de JK em Brasília
No final da primeira missa em Brasília, o presidente Juscelino Kubitschek fez seu primeiro discurso oficial na nova cidade que, ali nascia:
"Estamos, todos nós, altos dignitários da Igreja, militares, homens de Estado, todos nós aqui" — declarei — "reunidos, vivendo uma hora que a História vai fixar. Hoje é o dia da Santa Cruz, dia em que a capital recém-nascida recebe o seu batismo cristão; dia em que a cidade do futuro, a cidade que representa o encontro da pátria brasileira com o seu próprio centro de gravitação, recolhe a sua alma eterna... [...]", disse JK à época.
- Maio de 1957 - A presença de índios Carajás
Um grupo de índios da etnia Carajá, vindo da Ilha Bananal, foi a primeira delegação indígena a se apresentar na nova capital.
A visita ocorreu devido à primeira missa em Brasília. Segundo o Presidente JK, "após a cerimônia, teve lugar a homenagem que os índios carajás desejavam me prestar. Foi um espetáculo tocante e digno de registro".
- 1958 - A instalação do primeiro reservatório de água para Brasília
1958 - a instalação do primeiro reservatório d’água para Brasília — Foto: Arquivo Público-DF
Por ser o ponto mais alto do lugar escolhido para a construção de Brasília, a 1.172 metros de altitude, a Praça do Cruzeiro "testemunhou" a construção do Reservatório nº 1, que alimentaria toda a rede de distribuição de água potável da nova capital.
O Presidente JK relata em sua biografia: "Abriam-se valas ao longo das ruas e, por elas, corriam canos, à espera da água que estava captada na barragem do rio Torto e que, dali, seguiria para o Reservatório R-1 — em construção — no alto do Cruzeiro."
- 1974 - A Praça do Cruzeiro recebe tratamento paisagístico atual
1974: Praça do Cruzeiro recebe tratamento paisagístico atual — Foto: Arquivo Público-DF/Divulgação
A aparência arquitetônica atual da Praça do Cruzeiro foi construída em 1974, a partir do projeto do arquiteto Oscar Niemeyer. Toda a renovação arquitetônica e paisagística surgiu a partir do Cruzeiro.
- Setembro de 1981 - Praça do Cruzeiro recebe à sua frente o Memorial JK
Em 12 de setembro de 1981 foi inaugurado o Memorial JK, em frente à Praça do Cruzeiro.
Nesse mesmo dia, os restos mortais do presidente Juscelino Kubitschek foram transferidos para uma câmara mortuária construída dentro do memorial. Sob o olhar permanente do Cruzeiro que o tinha recebido pela primeira vez em 2 de outubro de 1956, hoje descansa o corpo de JK.
Entre fotos e documentos históricos
Para o superintende do Arquivo Público do DF, Adalberto Scigliano, a exposição virtual "Brasília, uma epopeia de 130 anos" é um "presente para população pelo aniversário da capital".
"Foram uma grande descoberta dos historiadores e arquivistas os inúmeros eventos e acontecimentos que a Praça do Cruzeiro abrigou. Isso também mostra o trabalho do Arquivo Público, que não é só preservar a memória, mas recolher e divulgar a história da população".
De acordo Scigliano, os visitantes da exposição online "vão encontrar fatos inéditos sobre a história de Brasília, de maneira mais leve e didática", diz. "São curiosidades que despertam a atenção da população para esses acontecimentos históricos".
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